Convívios preliminares com a matemática contemporânea
No segundo dia de aula para os estudantes
matriculados no quadrimestre 2018.2, na UFSB, houve, inicialmente, a apresentação
dos discentes, de onde vieram, suas expectativas com a universidade e o caminho
que cada qual pretende seguir e, por conseguinte a apresentação dos docentes.
Essa aula foi marcada por uma nova discussão acerca da matemática, tratada numa
perspectiva totalmente diferente daquela que os alunos são acostumados e introdução
do conceito de etnomatemática, que será desenvolvido ao longo das aulas,
fazendo com que, ao fim do quadrimestre haja a concretização da concepção desse
termo.
Além disso, nesse primeiro encontro, foi
estabelecido o plano pedagógico do quadrimestre vigente, as atividades que
serão realizadas, tais como: os Traçados Bora, Geometria Sona, Pavimentação, Escher,
Fractais e a Geometria das Transformações. Foi esclarecido também os
procedimentos avaliativos, uma dessas atividades será a Mostra Artístico –
Cultural, em grupo, a ser definido a data e o horário.
Desmistificando a
Matemática
A aula 02 do componente matemática e espaço,
ocorrida no dia 19/06, teve como objetivo o esclarecimento sobre a etnomatemática,
que é a forma de como a matemática está presente no cotidiano da sociedade,
sobretudo nas comunidades tradicionais e em diferentes contextos
histórico-culturais.
Normalmente não é mostrado ao educando, durante
o ensino básico, a utilização dessa disciplina no dia-a-dia, isso dificulta e
cria paradigmas em relação ao seu aprendizado.
Nesse viés, foi especificado pelos educadores a
respeito do uso da matemática pelo Povo Bora, amazônicos, na construção de
sextos além de descrever o contexto de simetria e seus dois modelos, radial
(presente na mariposa) e bilateral. E a partir disso, usando os Traçados Bora,
os docentes detalharam a simbologia matemática da identificação de mariposas, e
solicitaram aos alunos a construção de uma mariposa com formato (1,3,2) usando
fitas de papel cartão.
Foi requisitado também outra atividade:
Desenhar uma mariposa, antes de confeccioná-la.
E ao final da aula, foi sugerido que todo o
alunado da UFSB faça um Diário de Bordo no meio acadêmico, por meio de um blog
como passagem metodológica.
Imagens obtidas em sala de aula |
Continuidade dos Traçados Bora
No dia 26/06 o docente responsável por esse
componente, discutiu a respeito do trabalho feito pelo povo Bora (comunidades
tradicionais) relacionando com a simetria das mariposas e sua confecção no
papel quadriculado ou papel cartão solicitado pelo educador.
Nessa reunião, o docente explicou sobre a
matematização dos trabalhos confeccionados usando os traçados bora (resultando
na obtenção do número de fitas que se usa para construir determinada mariposa.
Pois a partir desse novo entendimento acerca da matemática, constatou-se que a
fórmula deve vir após a realização do experimento, isso porque é através dela
que se forma uma língua universal a respeito daquilo que se foi criado, isto é,
a objetivação, por exemplo, da quantidade de material a ser utilizado para
construir determinado objeto seguindo a proporção do tamanho que se quer
produzir.
Os últimos quarenta minutos dessa aula foi
destinado ao esclarecimento da elaboração de um diário de bordo, que será
difundido por meio de um blog, descrevendo as atividades acadêmicas realizadas na
UFSB. Foi elaborado um tutorial instruindo como executar a criação e
configuração desse sítio eletrônico importantíssimo para conexão docente – discente
nesse mundo virtual.
Abrangência das discussões
a respeito dos povos tradicionais
O quarto encontro desse componente, ocorrido no
dia 03 de julho, houve uma roda de conversa entre os educadores e a educadora,
para relatar sobre a ancestralidade e as raízes étnico culturais de cada indivíduo
presente. E a partir das constatações, discutiram-se sobre os hippies, que são
comunidades marcadas pelo modo de vida alternativo e que também produzem obras de
arte podendo ser relacionadas no campo de estudo da etnomatemática, como
pulseiras e colares. Esse grupo surgiu no contexto da Guerra do Vietnã e da
Revolução Verde, após a Segunda Guerra Mundial, durante a Guerra Fria. Essa
sociedade segue ideais Marxista e é revoltada contra o sistema capitalista.
Esses encadeamentos da década de 60 podem ser
comparados com a atual conjuntura brasileira, marcada pela desvalorização das antigas
culturas, ocasionada pela produção excessiva de sintéticos pelas indústrias de
grande porte e que substituem a maior parte das confecções artesanais feitas
manualmente, isso gera o crescimento progressivamente das amplas empresas em
detrimento das produções artísticas de povos tradicionais que contribuíam para
a preservação de hábitos e costumes hereditários.
Argumentação Diversificada
O início do quinto encontro do componente
Matemática e Espaço, sucedido no dia 10 de julho, foi marcado pela união de
vários objetos artesanais, oriundos de significativas tradições culturais,
perpassadas por várias gerações e que além de apresentarem fundamentos
matemáticos (que são os padrões geométricos presentes na estrutura de cada
utensílio), existem diversas finalidades, histórias, justificativas e técnicas
de construção. Dentre os inúmeros produtos expostos, teve as esporas, como representação
da vaquejada nordestina que é um costume herdado e reproduzido ao longo das sucessões,
hoje ela se tornou um esporte que cresce a cada ano, no entanto, há pouco tempo
atrás houve uma grande polêmica acerca da criminalização desse exercício, pelas
mais diversas acusações, mas foi elaborado um consenso entre o poder
legislativo e os atletas, e foi decidido então que essa atividade poderia
existir, desde que exigências necessárias fossem cumpridas. Houve também a exibição de outros instrumentos
artísticos, como o pilão, a cerveja artesanal, o vinho, etc e discutido todo o
processo de fabricação de tais produtos.
Ademais, foi explicado e retomado, com mais
detalhes, em sala de aula, o conceito de simetria, e aplicado na prática por meio
da detecção dessa definição nas mariposas associado ao seu padrão formado por quatro
planos (isso devido a junção de várias mariposas).
Além disso, nessa aula, iniciou-se os estudos a
respeito da Geometria Sona, caracterizada pela difusão de relatos históricos,
enigmas, jogos... usando um elemento educativo (desenho na areia) como meio para
otimizar a forma de ser transmitida a mensagem e de memorizar, pois, logo em
seguida, esse desenho é apagado, mas o aprendizado fica marcado na memória, e é
passada para outras pessoas.
Nota-se que a riqueza dessa cultura, originada pelos
povos africanos Cokwe, Luchazi, Ngangela do leste da Angola e de regiões
vizinhas deve ser explorada, apropriada e compilada, através de muitos
registros.
E ao final do encontro, foi solicitado que cada
discente realize traçados usando as mesmas propriedades dos desenhos sona.
Imagens obtidas em sala de aula |
Geometria Sona de Angola
(continuação)
No encontro do componente curricular Matemática
e Espaço, realizado no dia 17 de julho, corrigiu-se o a atividade exigida a
respeito da produção da lusona, e continuou-se a discursão acerca desse tema que
envolve uma complexidade cultural, de identidade africana e uma matematização
interessante. Após ter produzido no papel quadriculado, discutido e testado as
várias inferências, como (-Nº par e nº ímpar corresponde a 1:
3x12=3; 3x15=3; 4x16=4...) definiu-se que é possível obter a quantidade de fios
a serem usados para construí-la a partir do MDC (máximo divisor comum).
Além disso, foi esclarecido que há inúmeras
formas de Lusona, pois normalmente elas são confeccionadas como recurso
auxiliador na efetivação da narração de histórias, tais linhas das lusonas podem
significar os percursos feitos pelos personagens e os pontos representam os
atores.
Como a
interdisciplinaridade é um dos elementos que compõe as aulas na UFSB, a
educadora comentou sobre a ancestralidade humana, suas particularidades, as
distinções entre as espécies do ser humano que habitaram o planeta Terra e
detalhou-se um pouco mais sobre a nossa árvore genealógica.
Imagens obtidas em sala de aula |
Pavimentação
A
pavimentação é o preenchimento de determinada superfície a partir dos encaixes de
peças, que podem ser divididas em formas geométricas muito regulares ou com
polígonos irregulares, formando-se um mosaico. No entanto, não são todas as
figuras que têm essa característica de se encaixarem e cobrirem espaços, para desvendar
se pode haver pavimentação usam-se vários procedimentos matemáticos, a começar pela
seguinte fórmula:
.1°PASSO:
(n-2).180
n= número
de lados do polígono;
(n-2)=
equivale ao número de triângulos dentro do triângulo regular;
O cálculo
dessa fórmula obtém-se a soma dos ângulos internos do polígono regular.
.2°
PASSO:
Divide o
valor da soma dos ângulos internos do polígono pelo número de lados desse e se a
medida for um número divisível por 360, o plano será pavimentado.
Antes de
descobrir esse procedimento citado acima, no dia 26 de julho o docente
responsável por ministrar esse componente curricular solicitou aos educandos
que pavimentassem um plano, em dupla ou em trio, utilizando seis quadrados, quatro
triângulos, dois retângulos e dois paralelogramos, e depois de pronto foi
discutido a respeito de sua matematização, desvendando quais são os critérios
para que uma peça possa se juntar a outra.
Imagens obtidas em sala de aula |
Pavimentação
(continuação)
No dia 31 de julho a aula do componente
Matemática e Espaço foi bastante enriquecedora, pois dentre as atividades
realizadas, houve a construção do Pentágono do Cairo que é uma figura
geométrica com capacidade de pavimentar pois atende todos os requisitos
necessários, e para confeccionar é necessário traçar duas linhas de 45° graus, o
que foi uma novidade para a maioria dos educandos a descoberta de como traçar
uma reta de 45° utilizando apenas um compasso e uma reta.
Após a construção e pavimentação desse pentágono,
o docente apresentou a planta do novo campus da UFSB em Itabuna-BA, cujas salas
de aulas foram edificadas seguindo a forma do Pentágono do Cairo que exprime
vários benefícios, como a mudança no posicionamento do educador e educandos,
saindo do modo tradicional marcado por fileiras em único sentido, isso “desorganiza”
no bom sentido esse espaço acadêmico, anula a existência de cantos na sala de
aula, permitindo uma participação mais efetiva por parte do educando na busca
pela erudição.
Além da Pavimentação do Cairo, esse encontro
também tratou da contribuição do artista Maurits
Cornelis Escher para a ilusão de óptica e pavimentação, e ele explorou
bastante a geometria plana e espacial aplicadas na litografia, que é a arte na
pedra. Com esse entendimento os educandos
colocaram em prática a Geometria Escher encaixando várias peças produzidas e
cobrindo uma superfície. A principal característica dessa produção é a mesma
área que é retirada em um local deve ser reposta em outro espaço.
Imagens obtidas em sala de aula |
Geometria
das Transformações
A
Geometria das Transformações refere-se ao deslocamento de uma figura geométrica
qualquer de um determinado espaço para outro. Apresenta quatro propriedades: 1.
Transformação (que transmite a ideia de deslocamento de um ponto, uma pessoa,
lugar...), 2. Reflexão ou Simetria, 3. Rotação (movimento em torno de um eixo),
4. Dilação (dilatação, expansão de um corpo, objeto, ponto ou polígono).
Essa
forma matemática tem como base o plano cartesiano, onde qualquer ponto tem suas
referências no gráfico. Foi desenvolvido pelo filósofo, físico e matemático francês
René Descartes que também elabora a Política da Razão Pura, no contexto do
Iluminismo. Sua forma difundida para a busca pela erudição, representada pela
divisão do conhecimento em disciplinas, é usada até hoje em várias instituições
de ensino. No entanto, há universidades que não adotam esse pensamento, como a
UFSB (marcada pela interdisciplinaridade, uma maneira pela qual o aluno possa
fazer conexões entre as matérias, evitando assim seu isolamento com outras
áreas). Além disso, Descartes discute sobre o processo de construção da fórmula
matemática para resolução de determinado problema, que representa uma
linguagem universal possível de ler em qualquer espaço.
O
pensamento de René contribui para o desenvolvimento das propriedades da
Geometria das Transformações, mencionando a Translação em que a coordenada x é
aumentada por uma constante e a y por outra incógnita, essa adição faz com que a
figura analisada possa se mover de um espaço para outro.
Imagens obtidas em sala de aula |
Geometria
Fractal
A geometria fractal refere-se a um padrão de
repetição de uma micromolécula para uma macromolécula, que vai se expandindo proporcionalmente,
de forma simétrica com bastante precisão. O fractal está presente em vários
locais: em uma flor de girassol (repetindo-se padrões na macro e
microunidades), nos alvéolos pulmonares (podendo ser visto através do uso de
proteínas de fluorescência) e no mundo vivo.
A aplicabilidade do fractal é
bastante ampla, pode-se mencionar a construção de antenas (que traz inúmeros
avanços positivos, como o eco de frequência mais vasto, tamanho reduzido e
preços mais baixos), na produção de dispositivos eletrônicos, além do uso no
meio biológico em geral.
Embora esse padrão geométrico seja
adotado na fabricação de muitos aparelhos, ele é contestado pelo ramo da
matemática tradicional que preconiza a Geometria Euclidiana.
Abaixo encontram-se alguns modelos
de fractais:
Imagem por:http://www.astropt.org/2013/09/14/fractais-a-dimensao-escondida/ |
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Imagem obtida em sala de aula |
A
Pluralidade da Matemática
O Artigo Areia Ancestral, elaborado por Rogério Ferreira traz um maior esclarecimento acerca dos desenhos na areia realizados pelo povo SONA, de origem africana, especialmente da Angola, lugar que exportou muitos escravos para o Brasil durante o Período Colonial.
Um fato curioso é que embora a nação brasileira tenha raízes africanas profundas, no que diz respeito a genética e miscigenação, muitas tradições culturais peculiares aos afrodescendentes são desconhecidas pela maior parte de seus habitantes. Essa adversidade se deve, principalmente, a omissão da promoção do estudo, análise e discussão dessas culturas pela maior parte do setor educacional, devido a questões históricas associadas a hegemonia ocidental em detrimento de outras nações, desde a colonização. É notório, que a ausência desse conhecimento prévio sobre a cultura e importância de outras comunidades é um fator decisivo na construção do preconceito, discriminação e intolerância.
Pesquisadores do campo da etnomatemática conseguiram desmistificar atividades artísticas, como a Lusona e esboçaram didaticamente a fim de facilitar seus entendimentos para que não só os povos culturais (que têm maiores habilidades) possam realizar a confecção do objeto artístico analisado.
O conhecimento SONA vem ganhando forças por meio da contribuição de profissionais (akwa kuta sona) encarregados a dar continuidade aos estudos dessa geometria, apresentando aos jovens desde os procedimentos mais simples aos mais complexos. É importante ressaltar que esse trabalho não se resume em técnicas e desenhos, mas sim, criatividade, e aspectos socioculturais, pois o povo SONA utiliza a Lusona como um recurso para otimizar o processo de transmissão e memorização de histórias hereditárias.
O Componente curricular Matemática e Espaço teve o poder de transformar minha concepção a respeito da matemática, sobretudo em relação ao modo de APRENDER os conteúdos, pois nesse processo de busca ao conhecimento, é adotado a confecção de objetos com padrões matemáticos, incitado o desenvolvimento da fórmula para construção desses utensílios após várias tentativas e experimentos empíricos (isso faz com que o saber possa fixar em nossas mentes por muito mais tempo), além disso, é trabalhado e debatido sobre a cultura, os costumes dos povos que originaram tais artesanatos.
Imagem por: http://isabelamatematicando.blogspot.com/2016/10/etnomatematica-uma-abordagem-historico_19.html |
Amostra
cultural
Paulo Freire defende que a educação é um pilar na libertação das pessoas. Nesse sentido, as experiências por nós adquiridas na UFSB apenas ratificam esse pensamento que muito tem a nos ensinar. Desse modo, associando esse valor ao nosso cotidiano educativo a matemática e suas faces entram em nossa vida. E, por conseguinte, vamos descrever um breve relato sobre o que passou e deixaram marcas, marcas da sensibilidade, do valor, da experiência, da união, do respeito e do aprendizado.
Em primeira analise é importante descrever a importância do novo. Assim, durante a confecção das obras estudadas em sala de aula (Mariposa, Lusona, Escher e Fractal), tivemos uma experiência muito gratificante, executamos na prática o conhecimento edificado acerca dos costumes e da cultura dos povos tradicionais que deram origem a esses objetos artísticos. Tal exercício nos proporcionou o uso abusivo da criatividade, isso porque, além da técnica e aprendizado a respeito dos padrões geométricos, foi empregada a imaginação e inovação a fim de moldar as estéticas nas obras. Ademais, ao processar essa atividade, a equipe concebeu um breve debate e concluiu que o “DOM” não é uma linha divisória, pertencente ao campo das artes, que estabelece se o indivíduo está apto ou não para desenvolver determinado exercício. É notório, que algumas pessoas exprimem uma maior afinidade para tal, esse fato não significa um limite, isto é, todos têm a capacidade cognitiva para empreender. Dessa maneira, é necessário estimular nosso poder de criatividade, e no caso da confecção das obras apresentadas na mostra artística é preciso ainda seguir os padrões geométricos definidos.
Outro fator importante que o grupo manteve uma maior atenção foi quanto às dimensões das quatro peças, ao notar como se encaixam e melhor adequam ao espaço de 1,60 x 1,60 destinado pela mostra cultural. Desse modo, chegamos à conclusão que, a união e um bom diálogo saudável/coeso são fatores preponderantes na solidez de uma equipe. E uma amizade como afirmou Aristóteles é amor a sabedoria, então, vamos lá, que sejamos eternos aprendizes. Dessa maneira, nos despedimos com um sentimento de que tudo valeu a pena e nossos objetivos foram cumpridos. Obrigado por todo processo da construção educativa.
Imagens obtidas durante a realização da amostra cultural |
Jogou duro! É isso aí mano.
ResponderExcluirValeu Higor!!!
ExcluirAdan: interessantes as reflexões embasadas em pesquisas que você fez. A ligação entre hippies e os povos tradicionais que estamos estudando, pode lançar uma ideia interessante de estudos posteriores.
ResponderExcluirObrigado Joel,
ExcluirIsso!!! Assim como os povos tradicionais produzem objetos com padrões geométricos, o hippies também confeccionam obras de arte que é possível obter uma matematização.